Sobre o trabalho final de graduação em arquitetura

Finalmente organizei o material que produzi para o TFG e depois de passar um mês distante de todo o processo (que durou o semestre 2009.2), resolvi colocar nessa postagem basicamente o dossiê.

Peço desculpas, entretanto, pela forma resumida de apresentá-lo: a sensação que tive ao terminar o trabalho foi de que minhas defesas foram primárias, ou melhor, muito iniciais, no quesito teórico e na abordagem final da materialidade mas pelo menos, tudo que foi pesquisado me permitiu perceber onde eu estava me metendo e me aponta direções para continuar pesquisando os assuntos levantados.

Vídeo da apresentação:



Inspirações
O que é a cultura? Ou melhor, o que é a cultura metropolitana?
Essa pergunta foi a geradora de todas as inquietações que este trabalho propõe. Sem traçados diretos do ponto A ao ponto B, as propostas presentes são como uma trama, uma tapeçaria.

Segundo o pensador Massimo Canevacci, a cidade começou a sofrer uma transição entre cidade industrial para cidade comunicacional a partir dos anos 1970. Na então cidade industrial a fábrica era não apenas o local de produção econômica, mas também política.
A fábrica, através da produção, era o centro de conflitos e dava sentido econômico, cultural e sociológico para a cidade.

A transição da cidade industrial para a comunicacional acontece através da expansão do único centro de conflitos, a fábrica, em policentros de conflitos. Ou seja: o consumo, a comunicação e a cultura passam a ter uma importância às vezes maior do que a produção.

O consumo baseado em shopping centers, cinemas, teatros, Disney world e museus passa a desenvolver um público mais pluralizado, ou melhor, públicos. Esses públicos performam o consumo.

A comunicação na era digital, seja pela produção, valores, comportamento e identidade é um aspecto ainda mais importante.
Etnias, sexualidade, família e identidade estão cada vez mais pluralizadas e essa comunicação é um reflexo disso, tornando a cidade muito mais pluralizada também, conseqüentemente. Essa transição flexibiliza a territoriedade de uma cidade e as grandes áreas metropolitanas comunicacionais se cruzam, competem e desenvolvem esse estilo. Todo o conceito de cidade (família, trabalho, território) está mais fluido e um sintoma é a dificuldade encontrada por algumas pessoas em ter o mesmo trabalho ou morar no mesmo lugar por toda vida.

Essa comunicação favorece um público participativo, não apenas passivo, e a tecnologia da comunicação digital deixa essa participação ainda mais clara. Segundo Canevacci, o público deixa de ser espectador apenas para ser também espect-ator.

Em exposições de cultura digital, em instalações, as pessoas não ficam passivas. O Linux, a internet através do youtube, blogs, microblogs, Orkut, facebook, myspace também refletem isso.
Existe uma possibilidade, na cidade contemporânea, de desenvolver um conflito direto entre individuo e sociedade e essas novas expressões ajudam a modificar a percepção que as pessoas tem de cidade.

Essas formas de se comunicar baseadas na tecnologia digital e no consumo performático estão alterando drasticamente a relação entre as pessoas e a cidade. O espaço-tempo é alterado pelas comunicações simultâneas entre pessoas que moram em lugares distantes.

O olhar, diante desse contexto, é chave nessa mudança, pois essa constante sofisticação tecnológica favorece uma multiplicação perceptiva e cognitiva. Olhar e olhar-se, inventando para ambos novas formas de olhar torna-se extremamente significativo no mundo contemporâneo. A cultura digital desenvolve uma potencialidade de olhar simultâneo, interativo e às vezes criativo, como nunca antes.


Projeto
Um sintoma desses valores e comportamentos que a cidade abriga são os entre-lugares. As raves, os coletivos, as flash-mobs, por exemplo, são flexíveis e mutantes, estruturados e realizados em entre-lugares de forma dispersa e efêmera. A arte digital não possui restrição quanto ao número de cópias e quanto a materialidade. Conexões entre pessoas podem ser feitas em praticamente qualquer lugar no planeta, possibilitando acesso a culturas e conteúdos de todas as espécies: dominantes e subterrâneas.
A própria informação deixa de ser única para tornar-se múltipla, permitindo o foco na perspectiva única e muita vezes amadora.
A metrópole é então um sistema auto generativo e auto dissolvente de signos e símbolos, representados em lugares desde Karnak até Las Vegas. “símbolo no espaço antes da forma no espaço”.

Qual seria então a fusão de um espaço de informação, arte, comércio e arquitetura em Salvador? Que espaço poderia ser representante de uma metrópole comunicacional? O poder da imagem e a carência de espaços genuinamente públicos em Salvador possuem papel fundamental nesse conceito: relembrar a caverna de Lascaux torna-se necessário enquanto metáfora por ser um espaço público de abrigo, reunião, informações e imagens como o famoso bisão, desenhado nas paredes da caverna numa escala muito maior do que a real, proporcionando entretanto o impacto e terror necessários.

O Lugar
O lugar, na Avenida Sete de Setembro, vizinho imediato do modernista Edifício Sulacap e da Praça Castro Alves (visivelmente a praça mais importante de Salvador) é um espaço genuinamente sintomático de alguns dos piores “vícios” dessa Salvador de início de século XXI: um estacionamento. Situado no olho do furacão, por estar tão próximo de edificações e ruas historicamente e culturalmente relevantes, além de ser utilizado massivamente pelos pedestres, um lugar com tantas possibilidades é utilizado apenas para carros, demonstrando carências que a cidade ainda não resolveu.
A escolha do lugar é uma tentativa de oferecer para a cidade um espaço público, favorecendo aos pedestres (cerca de 600 mil pessoas circulam na Avenida Sete diariamente) um lugar que retome e reflita as características culturais, tão marcantes na região. Com espaço para bicicletario e um estacionamento subterrâneo na Praça Castro Alves, assume dessa maneira um pouco mais de mobilidade ao local.



Projeto
3 Ambientes
1- Caverna Digital
Ao trazer a metáfora da caverna de Lascaux para a cidade contemporânea, elementos como a fluidez e a dispersão possibilitam a transição para a criação dos ambientes. A caverna digital (nas cores azul vermelho) é abrigo, informação e imagem ao mesmo tempo.
Suas paredes são monitores imensos com tecnologia multi touch screen voltadas tanto para o individuo que a manipula diretamente quanto para quem está longe, possibilitando a interação de diversos pontos da cidade ou do planeta, através da internet.
Dessa forma, exposições digitais podem ser desenvolvidas e qualquer pessoa, artista ou amador, pode mostrar seu trabalho.
O piso da caverna começa no nível da calçada da Av Sete e é todo em pedra portuguesa. Além da rampa para o platô, tem um elevador com acesso direto ao subterrâneo.
Possui 1200m2




3 Ambientes
2- Platô
O segundo ambiente, o platô, além de ligar a caverna digital ao subterrâneo, faz, através de sua aridez, um contra ponto a dispersão da caverna e o confinamento do subterrâneo. Bancos, guardas sol de energia solar, mesas, wi-fi e vegetação, tornam esse ambiente mais próximo das praças, espaços públicos por excelência, possibilitando dessa forma uma série de eventos efêmeros como coletivos, raves, shows, flash mobs, pontos de encontro, etc.
Possui 880m2 e seu piso é de madeira.





3 Ambientes
3-Subterrâneo
O subterrâneo, com 2585 m2, abarca as necessidades de um espaço equipado para palestras, filmes, shows, peças teatrais e dança.
Conectado com o platô através da rampa em amarelo e possuindo uma saida para o estacionamento da ladeira da montanha em vermelho, ele é climatizado com ar condicionado central e seu contato com o exterior se dá através de rasgos na rampa de acesso e platô. Possui vagas para 6 carros.