Viagem ao Sul da Terra

Desfaço as malas, me desfaço. As coisas algumas vezes são assim, parece. Dentro das malas, quase tudo foi usado, poucas coisas inúteis. Quem não gosta da previsão dos tempos? É uma sensação boa trazer coisas novas, por mais simples que sejam: um porta copo bolacha de chopp da eisenbahn, aquelas esquinas de Curitiba, a pedra no tênis, as patas de cachorro nas calças.
Era pra ser uma viagem pra Floripa, com todas as maravilhas de conhecer uma ilha, de sentir aquele frio, de procurar cervejas conceituais, dar uma escapada pra Blumenau, ver a ponte, as belezas raras e fazer algo que eu adoro, sair aleatoriamente pela cidade, seja andando, seja pegando os ônibus locais. Nada de mini-ônibus de turismo pra mim.

Sai do campus da universidade federal no segundo dia e lá fui pegar um ônibus, direto pro centro da cidade. Mercado Público Municipal, a ponte vista do mirante, a figueira centenária, o shopping iguatemi, mercadinhos locais, um bar com chopp de Eisenbahn. Essa foi, basicamente, minha rota por quatro dias.
Bar em Floripa

Ponte

Alguma coisa, mesmo assim, estava errada. Foram quatro dias muito bons, mas em momento nenhum Floripa tirou meu chão. Talvez porque eu tenha ido pra gostar, talvez porque passei tempo demais no google earth e na wikipedia buscando informações da cidade antes de viajar. Me deu a impressão que tudo aquilo que eu li e pesquisei antes não cabia, não encaixava. Ou talvez, e provavelmente deve ser isso, Floripa encolhe demais com o frio do inverno.
Querendo ou não, é uma cidade cheia de praias, com uma relação forte com o sol, uma dependência, eu diria até. 400.000 pessoas moram lá, é uma cidade do interior.

Quem encolheu fui eu. Quem encolheu fui eu.

A idéia então era fugir. Fugir do enea, de Floripa, da viagem como havia sido planejada por dois meses. E assim foi. Uma fuga em conjunto com quatro amigos, após quatro dias na ilha. Joaquim, Lucas, Rafael, João Paulo e Manuel foram então pra bela rodoviária Rita Maria, comprar passagens pra uma tal de Curitiba. "Foi na pedreira que a Mtv transmitiu um dos últimos shows do Iron Maiden com Blaze, na Virtual Tour 1998. Em Curitiba os ônibus funcionam, um amigo meu já morou e falou algumas coisas que não lembro mais e o Bonde das Impostora é de lá." Era tudo isso que eu sabia de lá, era tudo que eu conseguia lembrar.

Passagens compradas, hospedagem no eco hostel garantida, cinco horas de ônibus e paisagens lindíssimas, lá fomos nós pra Curitiba. E lá se vai meu chão. A cidade me desmontou, me encolheu, me fez sumir. Desde o eco hostel até o centro, as quadras, a falta do mar, o frio, tudo isso foi me digerindo. Existe, definitivamente, algo muito forte em certas cidades que me deixam simplesmente feliz de caminhar num centro rodeado de prédios, de praças, de ruas limpas, de pessoas ríspidas e educadas. Foi assim em Belo Horizonte e foi assim no Rio. Era como ser o vento, sensação que só consigo ter poucas vezes. Esquinas aleatórias, direções aleatórias, ninguém te vê e você apenas vai "adiante". Ou melhor, você apenas vai, não existe norte nem sul. Na prática, só tivemos um dia de caminhadas e ônibus em Curitiba, pois chegamos na sexta e só de noite estavamos devidamente alocados, sobrou o sábado inteiro e no domingo de tarde já era hora de voltar pra Florianópolis. E isso foi mais que suficiente.
Oscar Gagá

A casa do moribundo

Curitiba é cidade pra voltar, voltar, voltar. E pra voltar no frio, no inverno. É a capital do frio, que seja. Florianópolis eu quero conhecer novamente, mas no verão, quem sabe assim eu realmente conheço, pois sinto que dessa vez não valeu, tivemos tempo, mas não tivemos momento. E assim segui pro aeroporto e pude novamente constatar que viajar de avião é simplesmente maravilhoso. Porque consigo, como uma amiga me disse "ver o tamanho dos meus problemas", porque consigo ver as luzes de Salvador à noite, tão lindas e o dique do tororó que passou ali e mal deu pra ver, mas vi. E trago na minha mala dois olhos porque Salvador agora, além de ser sempre mágicamente africana, está mais árabe pra mim: a europa do sul, a Alemanha do sul do Brasil me fez ver minha própria cidade de forma diferente.
Pronto, malas devidamente desarrumadas.

4 comentários:

|u disse...

manéo! cuidado que cerveja faz barriga crescer!
héé

Anônimo disse...

"Marquei dia 1º de julho na agenda pra não esquecer".
Lembra disso, né?
Inverno do ano que vem e Heinekens 600ml no barzinho perto do largo da Ordem.

Anônimo disse...

Oi Manoel:
Vc me convidou para fazer parte da comunidade A torre de Pizza ... e eudescobri que vc tem um blog.
Que bom. O meu chama Blog Linha.
Tentei me comunicar com vc para convidá-lo a fazer uma visita e não deu certo.
Agora esá feito. Apareça por lá.
Abraço

Anônimo disse...

e agora, manuel, o que é que eu faço com todas essas palavras?

é estranho, isso, eu fico me apaixonando pelas escritas dos outros. entrei aqui, de fininho no teu blog, como quem abre um diário ou uma cabeça. como quem lê o jornal na banca.

queria ler teus escritos, mas pagando por eles também. me dá uma raiva que as revistas que a gente compra não dizem nada especial. não dão cosquinha, nem vergonha. nem fazem a gente ficar curioso de tanta coisa.

(e eu que ia dizer de floripa: pra ti, a antártica, pra mim, os trópicos. é o extremo norte do meu brasil mental. me atiro no mar de agosto me sentindo em pleno verão, ante os olhares aterrorizados dos locais.
- você precisa viajar mais, pequeno gafanhoto!
- pô, mestre, não enche!)